quinta-feira, 29 de outubro de 2009

abstrai-se.



Claire uma escritora de meia-idade de boa parte do que haveria de viver, se descrevia de modo abstrato.
Cansada de si,queria se libertar de algo que a acompanhava nas horas do dia.
O vazio.O vazio de si preenchido por si.
E não eram morenos altos de olhos azuis que a libertariam desse estado sólido do que tampouco existe.

Nem as falsas verdades frente ao espelho que encobriam as rugas da face encoberta pelo creme que prometia milagre em semanas que já se passaram. E não preenchiam.
Nem o vazio. Nem as marcas do tempo.
Que apagava sob a aminésia alcoólica do dia anterior.
Em tombos sob a dor cefálica da razão existencial perguntava o porque de si.
E do nó.
Ninguém afinal sabia o que passava, tampouco duvidavam.
Seu ardor diante de cada passo revelava-se na sua face rosada.

Sua realidade interna se concretizava nas cores das tatuagens que envolviam sua pele clara em tamanha psicodelia.

Não era bonita nem feia. Sua roupas gritavam e falavam por si quando permaneçia muda.
Mas nada que preenchia o vago do seu sólido casamento com Heitor que fazia tudo para agradá-la, na medida em que sua conta bancário reduzia significativamente.
Ele era tudo que poderia. Menos quem ele era.
Sua identidade ocupava o papel de esposo eternamente apaixonado.
Em qualquer circunstância.
Espatifava-se aos cacos a personalidade do homem que um dia amarara.
E quem sabe o ame.
Mas do seu modo.
Enquanto às sextas feiras inclina seu batom vermelho frente ao espelho e sai a procura de si.
Camuflando suas vontades com champagne e beijo na boca.
Longe dele. O marido é claro.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Retaguarda

E de modo conciso não era a ela que recorria.
Tão pouco ao seu insólito desejo por mim.
Mas era a ela, por vaidade infantil e preponderada que me fizera retornar ao ponto crucial da minha própria existência. A essência.
Tão nobre quando derramada num desvio insano de ato de coragem.
Silencia meus medos decorrentes da verdade sombria.
Desenrola no ato os nós das meias-verdades jamais pronunciadas.
No próprio silêncio, mais claro que qualquer palavra dita.
Pronuncia o sorriso de nós e envolve ardente o enlaço da superfície que representa o interior da alma.
Tua face serena sob forma de luz, traça minha escuridão quando fecho os olhos e não a vejo.
Mas a minha luz nas águas refletem as vagas lembranças do que ainda guardo de ti.
Pouco palpáveis. Em meus dedos acaricio a tua vontade, explícita no compasso do seu pensamento.
E na lacuna vaga do tempo, seguro memórias pouco lúcidas na corda bamba para que não desfaleça o pouco de ti que ainda me habita.

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

***


Era assim, eu e você. E Nós dois. Não assim juntos, mas cada um em sua própria realidade que canalizava uma ligação entre ambos.
Estavam próximos porque coincidiam.
Não voavam mais alto do que podiam mas sonhavam mais alto do que poderiam. E esse era o segredo.
Não queriam se revelar por inteiro, pois isso só não bastava.
Primeiro haveriam de sentir.
A definição viria do outro lado.
O seu espelho.
O espelho do que queria e o que não deveria.
O espelho do medo de ser e o receio de não chegar a ser.
Embriagados pela própria verdade e sentido.